Wednesday, September 26, 2012

Portuguese pavements. Eduardo Nery: Círculo em mosaico integrado no pavimento interior do Espaço-Museu, no Rabaçal (1965/1999)



Círculo em mosaico integrado no pavimento interior do Espaço-Museu, no Rabaçal, 1965/1999

O desenho em círculos em preto e branco, vibratório e em expansão, datado de 1965, ou seja, do início da minha fase inicial na Op Art, foi seleccionado pelo Director do Espaço-Museu, Dr. Miguel Pessoa que o conheceu como ex-libris num livro meu. Ele começou por pedir a minha autorização para ele ser executado num pequeno painel realizado por artífices do Museu de Conímbriga, segundo técnicas de mosaico correntes nos mosaicos romanos, aliás exposto neste museu.
Mais tarde, quando foi iniciada a construção deste espaço-museu, ele propôs-me desta vez, que esse meu desenho fosse ampliado e integrado no chão no interior do edifício, no pavimento em madeira no pisso térreo, mais precisamente no grande átrio que serve como espaço polivalente para exposições e conferências. Dei-lhe novamente a minha autorização, e foi executado pelos mesmos artífices em técnicas usadas no restauro dos mosaicos romanos.
A meu ver resultou muito bem o contraste entre este círculo em preto e branco com o pavimento em madeira que o contém, e resultou bem como uma pequena jóia da Optical Art, num espaço arquitectónico muito maior. Mas antes de mais, ele constitui um excelente trabalho em mosaico, equilibrando muito bem o rigor do desenho geométrico, com a grande qualidade da execução e da textura no detalhe.
                                                                                                Eduardo Nery






[O autor deste blogue agradece a Eduardo Nery a autorização para publicar estes seus documentos (texto e fotos)]

Friday, September 21, 2012

Portuguese pavements. Eduardo Nery: Pavimento na Praça do Município, em Lisboa (1997/99)


Pavimento na Praça do Município, em Lisboa, 1997/99
      
No projecto deste pavimento em calçada-mosaico, a preto e branco, procurei resolver algumas questões prévias, que coloquei a mim próprio. Em primeiro lugar, criar um desenho geométrico para que a praça fosse percebida como um “tapete” homogéneo, com um padrão de triângulos rectângulos e de quadrados, que se estendesse a todas as áreas a organizar plasticamente neste espaço urbano, conferindo-lhe a máxima unidade interna.
Uma segunda questão, que procurei resolver foi criar um centro muito bem definido, no reforço do pelourinho, que sempre esteve colocado no centro desta praça. Para tal, criei um desenho circular em rotação, que prolongou e expandiu o movimento espiralado, da coluna-torsa do pelourinho, também ela em rotação interna. Por sua vez, o meu desenho radial foi subdividido em triângulos semelhantes aos que criei para a área restante da praça, garantindo assim uma grande unidade interna no desenho global do pavimento.
Por outro lado, para reforçar esta intenção de clara acentuação do centro da praça, projectei um tronco de cone (volumétrico) com uma leve inclinação, que veio erguer o pelourinho sobre o plano geral do pavimento, e que conferiu ainda mais ênfase ao desenho circular e em rotação, que projectei para o centro deste espaço urbano.
Não foi fácil ocupar com o padrão-base de triângulos as pequenas superfícies periféricas, nomeadamente os passeios separados pelas vias que atravessam a Praça do Município, como não foi fácil rematar esta malha rígida de triângulos junto às curvas dos referidos arruamentos, mas tudo se conjugou numa harmonia interna entre o projecto de espaços exteriores do Arqº Francisco Silva Dias, e o meu desenho de pavimento. Também foi importante a escolha que fizémos em conjunto do tipo de candeeiros instalados nesta praça. 
                                                                                                
 Eduardo Nery



















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Neste blogue:

Wednesday, September 19, 2012

Lisboa e a Praça do Município em 1903 (num texto de Aquilino Ribeiro)

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1903 - Por falta de vocação, [Aquilino Ribeiro] abandona os seus estudos durante a primeira parte do Curso Teológico no Seminário de Beja e fixa-se em Lisboa. 
Nota: O texto de Aquilino que a seguir se transcreve refere-se à sua chegada a Lisboa nas vésperas de ir para o Seminário de Beja.
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CHEGÁMOS a Lisboa na manhã tépida, de céu ambarizado por um sol que há cinquenta anos a esta parte era raro faltar à cidade, que deixou de ser de mármore e granito para ser, no seu maior dimensional, de tijolo mal cozido e cimento roubado. E, conduzidos por Costa Nunes, fomo-nos hospedar no Hotel Portugal, que fazia esquina para o Largo do Pelourinho. O meu quarto era no terceiro andar. Eu via com olhos, não pasmados, que nunca soube o que era pasmo, mas abertos à compreensão, as grandes e amarelas tartarugas dos carros eléctricos vir rolando dos lados do Terreiro do Paço, tilintantes e pletóricas de gente. Logo após vinha o carro do Chora, com o automedonte de longos bigodes retorcidos a reger de chicote vivaz o tiro de três machos pimpões, o condutor de boné de pala, e atropeladamente naquela arca de Noé peixeiras, vendedeiras de hortaliça e de coelhos mansos, operários com suas ferramentas, em suma, segundo o termo das Ordenações Manuelinas, os misquinhos duma capital. O bulício ficava muito aquém do sonhado, embora me desse uma idéia numérica de disparidade em comparação com as ruas Formosa ou Direita, de Viseu. Mas a Câmara de tão bela frontaria, o pelourinho especioso, coroado pela esfera armilar, os prédios de roqueira solidez, incutiam a noção de capital dum reino, batida pelo tempo, com a velha epopéia impressa em suas pedras e arruados. Todavia não pressenti o sumptuoso, nem o deliquescente duma urbe meridional, de que os poetas e romancistas faziam cavalo de batalha nas suas especulações cantarizadas. Antes havia nela, nos habitantes, no céu, nas coisas, uma sobriedade afável que era grata de sentir. E por isto tudo, por essa desilusão literária, e porque representava para mim um degrau montante na escala dos conhecimentos, fiquei a adorar Lisboa desde esse dia.
(...)

Monday, September 10, 2012

Portuguese pavements. Eduardo Nery: Pavimento sob a cúpula na entrada sul, na Sede da Caixa Geral de Depósitos, (1992/93)


Pavimento sob a cúpula na entrada sul, na Sede da Caixa Geral de Depósitos, 1992/93

Este desenho de pavimento em calçada-mosaico, em preto e branco, foi concebido como uma projecção dos círculos concêntricos, que existem por cima na cúpula em mosaico, também projectada por mim. Assim, no pavimento o círculo central tem o mesmo diâmetro do que o óculo central aberto para o céu, mas os círculos seguintes já não podem respeitar o dimensionamento das várias coroas circulares em mosaico vítreo, em três dimensões. O importante é que o pavimento funcione como um pálido reflexo no chão do tema cósmico desenvolvido em cima, na cúpula.
Eduardo Nery
 



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(As imagens e texto seguintes foram copiados por mim de)
[Autor(es): Paulo Henriques, Rocha de Sousa, Sérgio Vieira]
 


 
[1991/1993]
Edifício da sede da Caixa Geral de Depósitos, entrada sul, Lisboa.
Organização plástica da cúpula em mosaico e vitral e do pavimento em calçada-mosaico.
 
PROJECTO AROUITECTÓNICO Arsénio Cordeiro
CONSULTOR PARA ARTES PLÁSTICAS Arquitecto Frederico George
Revestimento em mosaico da cúpula
PROJECTO 1991 e 1992
EXECUÇÃO E ASSENTAMENTO Entre 1992 e 1993
DIMENSÕES DA SEMIESFERA 5,50 m x 11,00 m 0
Composição em gradações de luz e cor construídas com tesselas vítreas de 2 x 2 cm, utilizando apenas 4 das cores existentes no catálogo industrial
ASSENTAMENTO DOS MOSAICOS Lazaretto da fábrica de mosaicos Bisazza
ENCOMENDA Caixa Geral de Depósitos 

Sunday, September 02, 2012

Portuguese pavements. Eduardo Nery: Pavimentos em calçada-mosaico no Martim Moniz, Lisboa (1981/88)


Pavimentos em calçada-mosaico no Martim Moniz, Lisboa, 1981/88

1 – Adro da Capela de Nª Sª da Saúde
Por falta de tempo em 1981 (data do concurso de renovação urbana do Martim Moniz), este espaço foi deixado como um vazio a organizar posteriormente.
Por essa razão, no projecto de execução dos pavimentos uma das principais preocupações foi a marcação de dois eixos extremamente importantes, correspondentes aos dois principais percursos no atravessamento pedonal desta área um pouco indefinida, a meio caminho entre um espaço-rua e um espaço-praça, entendido como adro da capela.
Um deles corresponde à clara marcação do prolongamento do eixo da Rua da Mouraria, através de uma sucessão rítmica de círculos em direcção à parte mais estreita desta rua, iniciada a sul com um labirinto.
O outro vector importante, e que corta quase perpendicularmente o anterior, corresponde à acentuação do percurso pedonal, que liga entre si duas escadarias existentes “frente a frente” nas duas colinas do Martim Moniz, percurso esse que foi claramente explicitado pelos projectistas do Plano, através de uma alameda ligando entre si essas duas escadarias.
O tema geométrico que unifica estes ritmos de linhas rectas e curvas é um elemento decorativo simples, constituído por duas barras de 20 cm, cada, com uma largura total de 1 metro, o qual volta a surgir no passeio na Rua da Capela, procurando assim ligar entre si espaços bastante diferentes e relativamente afastados.
Seja como for, o elemento polarizador no adro da capela será sempre o rebatimento da fachada principal sobre o pavimento, prolongado para sul através da repetição das linhas curvas do frontão. Aliás, esta repetição do arabesco superior do frontão tem uma dupla função plástica: - a do prolongamento virtual da própria capela, como translação ao longo do adro, e da autonomização gráfica do arabesco curvo, transformado aqui em simples elemento decorativo, que articula entre si dois formulários distintos, o dos elementos arquitectónicos rebatidos, com o jogo mais livre e ritmado das barras de 20 cm.

2 – Rebatimento de duas fachadas da Capela de Nª Sª da Saúde
Como esta proposta se mantem intacta desde 1981, sem alterações significativas, limito-me a repetir aqui a parte da memória descritiva do concurso, que lhe diz respeito:
O rebatimento sobre o chão de duas fachadas desta capela visa dois objectivos opostos: - grantir uma maior integração deste edifício no novo espaço urbano, e, em sentido inverso, dar mais ênfase à sua situação de edifício singular, diferente dos demais no Martim Moniz.
Quero salientar é que, ao fazer estes rebatimentos, não pretendi de modo algum ridicularizar ou banalizar a capela. Pelo contrário, procurei revitalizá-la, chamando mais a atenção sobre ela. Não porque se trate de uma construção com grande interesse arquitectónico. O seu valor deriva sobretudo da sua importância religiosa e também afectiva para os lisboetas que gostam da sua cidade, visto tratar-se do único testemunho “sobrevivente” ao camartelo dos anos 50, que arrasou toda esta área da cidade.

3 – Malha de triângulos na Rua da Mouraria
Neste desenho para calçada-mosaico exitem alguns aspectos importantes a salientar:
- Antes de mais, trata-se de um pavimento em empedrado com uma malha de desenho que combina duas características quase opostas: por um lado, esta malha é suficientemente densa para criar o sentimento de preencher o espaço-rua na sua totalidade; por outro, é suficientemente flexivel para permitir apontar diferentes direcções de percursos (como se poderá esperar do movimento aleatório dos peões), contribuindo ao mesmo tempo para acentuar a própria sinuosidade do traçado desta rua muito antiga.
- Na sua composição houve o cuidado de marcar linhas diagonais, que convergem para o portal principal do Centro Comercial, numa situação de simetria relativamente ao eixo dessa entrada, já de si reforçada pelo grande quadrado negro de 4 x 4 metros, também implantado no seu eixo.
- Também as mudanças de ritmos e de dimensões dos 3 módulos diferentes dos triângulos conferem diferentes escalas ao desenho global, permitindo adaptar-se simultaneamente à estreita passagem existente a sul, sob o Centro Comercial, ou aumentá-lo para grandes quadrados no topo norte da Rua da Mouraria, precisamente na zona aonde ela mais se alarga.
- Aliás, neste empedrado, a forma mais estática do quadrado alterna com a dinâmica mais direccional do triângulo, criando um percurso bastante rico de “surpresas visuais”, na medida em que os próprios quadrados são gerados por triângulos, e estes últimos gerados por sua vez no seio de uma malha de quadrados, com base numa modulação quadrangular de 2 x 2 metros.
- Este fazer e des-fazer da malha estrutural, oscilando entre o triângulo e o quadrado é tanto mais enfático, quanto as formas tendem a “dissolver-se”, ou a soltar-se nas duas margens da rua, numa situação claramente assumida de assimetria, com o desenho rematado a preto junto do edifício novo do Centro Comercial e a branco junto das construções mais antigas.

Eduardo Nery

(Excertos da memória descritiva e justificativa, datada de 3/05/1988, do “Projecto de execução dos pavimentos e de arranjo dos espaços exteriores do Sector IV no Martim Moniz”)





























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