Thursday, August 30, 2012

No era así como yo me imaginaba a Miguel Angel camino de la Capilla Sixtina...


El faro

—¿Qué vas a ser cuando seas grande?— me preguntaban los grandes, y yo mentía que no sabía.
Pero sabía. Yo iba a ser jugador de futbol, santo o pintor.
Por patadura y por pecador tuve que renunciar, desde temprano, a la pelota en los pies y al halo en la cabeza. Algún tiempito más me duraron las ilusiones del pincel en la mano: un vecino de casa, Giscardo Améndola, artista profesional, era tan bondadoso que me estimulaba a seguir cometiendo chambonadas contra su noble oficio. Un día, Améndola me hizo el honor de invitarme a acompañarlo. Un bar de la costa, El Malecón, que tenía ventanales abiertos sobre la playa, le había encargado un mural. Fuimos caminando. Améndola no llevó caja de pinturas, ni pinceles, ni escalera, ni nada. No era así como yo me imaginaba a Miguel Angel camino de la Capilla Sixtina, pero no hice preguntas.
Nos esperaba una gran pared, toda pintada de negro. Améndola se plantó ante la pared y allí se quedó, un largo rato, mirándola fijo. Cada tanto, se rascaba el mentón. Y yo pensaba: ¿Va a pintarla, o va a hipnotizarla?
Por fin, sacó del bolsillo una moneda de cinco reales, una gran moneda de plata, de borde dentado, y se subió a una silla. Moneda en mano, atacó la pared. Y el filo de la moneda hirió la pared con largas líneas blancas, que se cruzaban sin ton ni son. Yo lo miraba hacer, callado la boca, sin entender esa esgrima; hasta que después de unas estocadas, vi aparecer un faro en la negrura, un poderoso faro que se alzaba entre las rocas y daba luz al oleaje bravío.
Han pasado los años, y todavía creo que la negra pared de aquel bar había estado esperando ese faro, un faro nacido de una moneda, para salvar del naufragio a los marineros de los barcos y a los borrachitos del mostrador. Era eso lo que la noche de la pared estaba necesitando; y el artista era artista porque había sabido escucharla.
 

Monday, August 27, 2012

Portuguese pavements. Eduardo Nery: Estação do Metropolitano do Campo Grande, Lisboa (1983/92)


Pavimentos no interior da estação Campo Grande, do Metropolitano de Lisboa, 1983/92

A intervenção plástica no interior acabou por se alargar à definição da cor global de todas as zonas públicas, à excepção do futuro centro comercial no piso térreo, enriquecida ainda pela possibilidade de ter desenhado padrões geométricos para pavimentos em granito e para os azulejos monocromáticos texturados, nas escadas e em pequenas paredes no átrio central. Aliás, todo este grande espaço do átrio é definido por uma “cinta” de azulejos brancos, amarelos e azuis, que o transformam num espaço contido, apesar das inúmeras aberturas e interrupções, de janelas, portas e escadas. Também o desenho deste pavimento, igualmente em quadrados (que respeitam a modulação da arquitectura da estação), define claramente um centro forte em torno da escada principal e um eixo transversal bem marcado, em direcção às duas entradas laterais. Neste pavimento estão ainda enunciados diversos percursos internos, em especial o encaminhamento dos utentes, através de obliteradores, para as escadas que ligam o átrio ao piso superior dos cais.
                                                                                    Eduardo Nery

(excerto de um texto publicado numa monografia sobre a Estação Campo Grande, editado em 1993 pelo Metropolitano de Lisboa)








[O autor deste blogue agradece a Eduardo Nery a autorização para publicar estes seus documentos (texto e fotos)]

Friday, August 24, 2012

Wright, Fleming, a investigação científica e os mercadores de tapetes persas




(...)
Fleming entrou para o laboratório em 1906. Duas salinhas modestas com frascaria em desuso, e mesmo assim mantidas em grande parte com o dinheiro que Wright ganhava na clínica, pois ele achava que todo o médico, mesmo bacteriologista, devia continuar com a prática clínica, «a fim de manter os pés na terra». Pagava aos assistentes cem libras por ano e, se desconfiava de amuos e refilices, tinham de lhe ouvir uma trovejada prédica sobre o apostolado da investigação. Esta ou era desinteressada ou não seria coisa nenhuma. Fizessem-se antes mercadores de tapetes persas.
(...)
Embora o facundo mestre, presidindo no seu cadeirão da secretária, tivesse tendência para falar todo o tempo, havia quem lhe fizesse frente. Apenas Fleming preferia calar-se. E se, de raro em raro, ousava interrompê-lo, era para o varar com as frases mais simples mas, simultaneamente, mais perturbadoras: «Isso não daria nada na prática.» Wright, que gostava de especular sobre proposições científicas como se estivesse perante um tema de arte, apreciando que alguém dissesse: «Aquela experiência foi uma obra-prima», irritava-se com essa secura de Fleming, para ele herética e inconveniente. Por isso, provocava-o de quando em quando, beliscando-lhe os brios de escocês ou tentando pôr em causa a sua erudição literária. Mas Fleming saía-se bem, nunca se mostrando agastado. Aliás, na ambiência prevalecia o desconstrangimento e a jovial improvisão. De uma vez, um francês noviço viu Fleming aproximar-se de Wright, picar-lhe um dedo e extrair sangue para um cotejo com outra análise, sem que o mestre tivesse sequer interrompido o discurso. Foi-se dali sem saber que pensar de tal gente.
(...)
Os caçadores de patentes corriam agora para o negócio do século. Mas os cientistas ingleses insurgiam-se contra a ideia de exclusividades e contra a tentativa de registo comercial da marca Penicilina. Agora que se espalhara a notícia sensacionalista das virtudes da droga-panaceia, apareciam à venda pomadas, pastilhas e até cremes de beleza à base de penicilina. Fleming, certo de que todo esse aranzel seria efémero, comentou para Mortimer:
— Que irão inventar mais? Talvez um bâton para os lábios.
— É muito possível. E o lançamento poderia ser feito com este pregão: «Beije quem quiser e como quiser; escapará a todas as consequências desastrosas, salvo o casamento, se usar o bâton-penicilina.»
(...)
John Smith, director da Pfizer, que era então o maior produtor de penicilina, teve com ele este diálogo:
— Porque não fez as coisas de maneira a obter direitos que lhe permitissem, a si e aos seus, viver como pertence a um homem que prestou um tal serviço à humanidade?
— Nunca pensei nisso.
(...)

Tuesday, August 21, 2012

Portuguese pavements. Eduardo Nery: Concurso para reformulação do Martim Moniz (1981)


Pavimentação e Arranjo dos Espaços Exteriores do Largo Martim Moniz, (memória descritiva redigida na participação junto da equipa vencedora do concurso de renovação urbana do Martim Moniz, em 1981)

Propõem-se dois tipos de pavimentos distintos: a calçada de vidraço, que será utilizada em toda a área de intervenção, excepto nos pátios situados na encosta poente, os quais serão pavimentados em lajetas prefabricadas de betão, quadradas, com 40 x 40 cm.
Vários objectivos tentam ser atingidos, nomeadamente: 
- Fornecer à imagem urbana maior unidade e homogeneidade, generalizando a toda a área de intervenção os dois temas geométricos do círculo e do quadrado, com os quais se organizam diferentes padrões, com escalas visuais devidamente ajustadas aos diversos espaços. Com estes dois tipos de variações adapta-se o desenho do pavimento, quer à ampliação, quer à estreiteza dos espaços onde se situam, tirando igualmente partido dos ângulos de vista de onde podem ser apreciados. 
- Acentuar os principais percursos, por forma a que o traçado do desenho contribua para exprimir e caracterizar o tipo de movimento que se efectuará sobre esses pavimentos (peões), ou na sua proximidade (automobilistas), bem como determinados eixos de circulação, linhas de composição da arquitectura  (proposta ou preexistente), ou certos enfiamentos. 
-Compensar o claro-escuro ambiental, equilibrando a maior ou menor intensidade luminosa incidente sobre os pavimentos desenhados, através do jogo do branco-preto do vidraço, por tal forma que o branco domine nas ruas mais sombrias e, inversamente, se aumente a área ocupada pelo preto nos pavimentos mais expostos ao sol. 
- Diferenciar zonas de estar de zonas de passagem. Assim, tanto os pátios a meia encosta, como a praça principal foram desenhados com formas dotadas de dinamismo e de ritmo próprios, com a malha de composição a travar e a encerrar parcialmente esse movimento. Em contrapartida, as barras que acompanham a via principal de trânsito automóvel, em diagonal, e sobretudo os padrões das ruas pedonais, são caracterizados por um movimento fluído, muito mais livre, que acentua percursos dinâmicos, estabelecendo o necessário contraponto com as zonas de estar. 
- Integrar no desenho do pavimento parte das árvores e certo mobiliário urbano, bem como expressar certas idéias sugeridas por outros elementos preponderantes e polarizadores do espaço urbano. Assim, nas ruas mais estreitas os pavimentos integram na sua malha os círculos das caldeiras das árvores (e indirectamente o contorno das suas copas), e determinam a colocação dos quiosques, eles próprios desenhados com base na forma circular ou esférica. Por outro lado, como outro exemplo, a agitação da água da fonte situada no centro da praça principal comunica-se a todo o espaço circundante, através da ilusão do movimento centrífugo do desenho do pavimento. 
-  Finalmente, o rebatimento sobre o chão de duas fachadas da Capela de Nª Sª da Saúde reforça a sua integração na nova proposta urbana, ao mesmo tempo que acentua a sua força expressiva de elemento arquitectónico ímpar, fazendo irradiar o seu duplo (a sua imagem rebatida) ao espaço envolvente.

Eduardo Nery
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[O autor deste blogue agradece a Eduardo Nery a autorização para publicar estes seus documentos (texto e fotos)]

Ver:

Saturday, August 18, 2012

Federico García Lorca (5 de junio de 1898 – 18 (?) de agosto de 1936)

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(Rafael Alberti)

Qué lejos por mares, campos y montañas!
Ya otros soles miran mi cabeza cana. Nunca fui a Granada.
Mi cabeza cana, los años perdidos.
Quiero hallar los viejos, borrados caminos.
Nunca vi Granada.

Dadle un ramo verde de luz a mi mano.
Una rienda corta y un galope largo.
Nunca entré en Granada.
¿Qué gente enemiga puebla sus adarves?
¿Quién los claros ecos libres de sus aires?
Nunca fui a Granada.

¿Quién hoy sus jardines aprisiona y pone
cadenas al habla de sus surtidores?
Nunca vi Granada.

Venid los que nunca fuisteis a Granada.
Hay sangre caída, sangre que me llama.
Nunca entré en Granada.

Hay sangre caída del mejor hermano.
Sangre por los mirtos y aguas de los patios.
Nunca fui a Granada.

Del mejor amigo, por los arrayanes.
Sangre por el Darro, por el Genil sangre.
Nunca vi Granada.

Si altas son las torres, el valor es alto.
Venid por montañas, por mares y campos.
Entraré en Granada.

Baladas y canciones del Paraná (1954)
Video: 
En este blog:

Tuesday, August 14, 2012

Portuguese pavements. Eduardo Nery: Pavimento destinado a uma alameda em Borba (1979)


Pavimento destinado a uma alameda em Borba, 1979 (não concretizado)

A encomenda deste pavimento e a minha participação no arranjo dos espaços exteriores da área ocupada pela Escola Preparatória de Borba (Alentejo), e o seu prolongamento para os espaços camarários anexos partiu da Indubel, a firma construtora da Escola, por proposta do Arqº João Paciência, seu consultor técnico e autor dos arranjos exteriores da escola e da aplicação do projecto-tipo da D.G.E.E. (M.E.C.)
A colaboração que se seguiu foi extremamente rica, porque o Arqº João Paciência não se limitou, como por vezes acontece, a definir a área de intervenção plástica, participando directamente em todo o processo de desenvolvimento do trabalho, até à solução final do remate do topo mais afastado da Escola.
Também a minha intervenção não se limitou ao desenho do pavimento, tendo podido projectar a escada que liga um parque de estacionamento com a zona central da alameda, e ainda uma plataforma circular no topo mais distante da escola.
O desenho do empedrado, relativamente complexo na sua articulação e diversidade de motivos circulares, obedece sempre à malha estrutural subjacente, visto todas as curvas terem sido traçadas a partir dos centros das caldeiras das árvores.
As árvores, embora crindo jogos de sombras, que interferirão certamente de forma aleatória e inesperada sobre o desenho do pavimento, farão parte integrante de um espaço concebido para as conter e as envolver.
O ritmo geral destes espaços vive da conjugação dinâmica entre zonas de movimento quase obcessivo, contrabalançadas por outras muito mais calmas, marcadas apenas por pequenos círculos ou por coroas circulares.
Por sua vez, todas as escadas ou a plataforma circular no topo da alameda obedecem a um sentido rítmico que prolonga o espírito do desenho do pavimento principal, embora a escada mais dinâmica seja aquela, que liga o meio da alameda com o parque de estacionamento, vivendo de um jogo de estrangulamentos e de “distenções”, geradoras de variações ao longo do seu percurso.
Embora insuficientemente estudado, previ uma situação intermédia entre a árvore e o cilindro de betão pintado de vermelho, constituída por pilares cilíndricos, com a armadura de ferro saindo no topo circular, na vertical (e não em diversas direcções, como se pode ver na fotografia da maquete), numa situação irónica de metamorfose entre o tronco e a copa de uma árvore, e o “tronco” cilíndrico em betão.
                                                                                    Eduardo Nery












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Wednesday, August 08, 2012

As linhas com que se faz uma flor

 
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«– Je travaille tant que je peux et le mieux que je peux, toute la journée. Je donne toute ma mesure, tous mes moyens. Et après, si ce que j’ai fait n’est pas bon, je n’en suis plus responsable; c’est que je ne peux vraiment pas faire mieux.» (MATISSE)
Pede-se a uma criança. Desenhe uma flor! Dá-se-lhe papel e lápis. A criança vai sentar-se no outro canto da sala onde não há mais ninguém.
Passado algum tempo o papel está cheio de linhas. Umas numa direcção, outras noutras; umas mais carregadas, outras mais leves; umas mais fáceis, outras mais custosas. A criança quis tanta força em certas linhas que o papel quase não resistiu.
Outras eram tão delicadas que apenas o peso do lápis já era demais.
Depois a criança vem mostrar essas linhas às pessoas: Uma flor!
As pessoas não acham parecidas estas linhas com as de uma flor!
Contudo, a palavra flor andou por dentro da criança, da cabeça para o coração e do coração para a cabeça, à procura das linhas com que se faz uma flor, e a criança pôs no papel algumas dessas linhas, ou todas. Talvez as tivesse posto fora dos seus lugares, mas são aquelas as linhas com que Deus faz uma flor!

Almada Negreiros, A invenção do dia claro